terça-feira, 19 de julho de 2011

Estado oligárquico, Estado desenvolvimentista e Estado neoliberal

CURSO: GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL
DISCENTE: CLEUBER DA SILVA COSTA
1-Considerando os conteúdos tratados nas duas Unidades desta disciplina, descreva as relações entre Estado, governo e mercado no Brasil ao longo do século XX, identificando as características principais do Estado oligárquico, Estado desenvolvimentista e Estado neoliberal relacionando-as com as mudanças produzidas nas duas matrizes teóricas que explicam as relações entre Estado e sociedade no mundo capitalista.

Estado,  organização que exerce o poder supremo sobre o conjunto de indivíduos que ocupam um determinado território. Em um regime democrático – em que os governantes são eleitos e têm seus atos constantemente submetidos ao escrutínio* da opinião pública e dos formadores de opinião – a força de um governo depende, em grande parte, do apoio que suas propostas políticas e proposições legislativas encontrarem no parlamento; da sintonia entre suas ações e as expectativas dos eleitores; e da relação mantida com os diferentes grupos organizados da sociedade – meios de comunicação, sindicatos e associações, empresas e ONGs etc. A história tem mostrado que os mecanismos de mercado são bastante favoráveis ao aumento da produção, desenvolvimento tecnológico e da riqueza em uma sociedade. No entanto, a experiência histórica mostra também que o notável aumento da riqueza social ensejado pelo livre curso das leis do mercado acaba concentrando-a nas mãos de uns poucos.
A lógica do mercado não só permite como estimula os indivíduos a arriscarem os seus recursos privados em empreendimentos econômicos diversos na procura de satisfação econômica. Por meio da competição, que é a regra básica do mercado, e da busca do lucro, que é a sua mola propulsora, o mercado acaba selecionando os “melhores” – isto é –, aqueles que são economicamente mais fortes, mais produtivos, que fabricam produtos e prestam serviços de melhor qualidade e que oferecem preços mais baixos, eliminando assim os mais “fracos” e menos produtivos e competitivos. De acordo com o pensamento liberal, todos os indivíduos são iguais por natureza e igualmente portadores de direitos naturais aos quais eles não podem, em hipótese alguma, abdicar: os direitos à liberdade e à propriedade. No estado de natureza, isto é, naquele em que não houvesse um poder estatal constituído regendo a relação entre os homens,  não haveria segurança e todos ficariam na espreita esperando serem atacados essa condição miserável da humanidade no estado de natureza que a teria levado a celebrar um pacto, dando origem ao Estado. Ao transferirem o direito natural de utilizar a própria força para se defender e satisfazer os seus desejos para um ser artificial e coletivo –  os homens estariam trocando a liberdade natural pela liberdade civil e a independência pela segurança, obrigando-se mutuamente a se submeter ao poder do Estado.
Mas se o Estado liberal sobreviveu ao advento da democracia  e, contra todas as expectativas, mostrou haver compatibilidade entre  sufrágio universal e economia de mercado, ele não resistiria à crise financeira, econômica e social que eclodiria com a quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 1929. A complexidade da economia e da sociedade capitalista havia chegado a tal ponto que mesmo os mais convictos liberais não eram mais capazes de acreditar que o mercado fosse autorregulável, dispensando a intervenção do Estado. A partir daquele momento, uma onda antiliberal começaria a se espalhar pelo mundo, ainda que de forma e com intensidade diferentes conforme a região do planeta, sendo menor nos países onde o liberalismo havia criado raízes mais fortes na mentalidade popular e das elites econômicas e políticas, e maior onde a sua penetração havia sido mais limitada.

As classes sociais são um conceito-chave do pensamento marxista e seriam identificadas e definidas por sua inserção no processo produtivo, resultante da divisão social do trabalho. Em cada período da história, as classes fundamentais de uma sociedade seriam aquelas diretamente ligadas ao modo de produção dominante, as forças produtivas, isto é, o trabalho humano, os meios de produção – tais como a terra, as máquinas e equipamentos – e as tecnologias empregadas na produção; e  as relações de produção, que se estabelecem entre as diferentes classes sociais e que envolvem. Portanto, a perspectiva de Marx não pode jamais ser tomada por anticapitalista, como a de alguns socialistas utópicos, mas sim por pós-capitalista. Segundo Gramsci, o Estado não se manteria nas sociedades capitalistas apenas pela força, mas exerceria o seu poder por meio da ideologia, isto é, da hegemonia cultural dos valores burgueses, compartilhados inclusive pela classe operária. No campo da teoria econômica, o pensamento predominante no período do pós-guerra seria o do inglês John Maynard Keynes (1883-1946), para quem o capitalismo contemporâneo não poderia funcionar no seu ponto máximo de eficiência regulado apenas pelas leis do mercado, necessitando, para tanto, da influência e intervenção deliberadas do governo.
Sob o Estado socialista o pêndulo chegaria ao seu ponto máximo à esquerda com o Estado ocupando o maior papel já desempenhado na regulação da vida social e o mercado, o menor.  Diferentemente do Estado liberal, que se pretendia equidistante das classes sociais e neutro em relação aos seus interesses específicos, o Estado socialista reivindicaria a representação dos interesses da maioria trabalhadora – dos campos e das cidades –, antes oprimida pelos capitalistas. Mas Hannah Arendt e Raymond Aron, que formulariam o conceito de totalitarismo para definir o regime político vigente, inicialmente, na União Soviética, e depois adotado por outros países socialistas em todo o mundo. A essência do totalitarismo estaria na intenção de controlar todas as instâncias da vida social – a ponto de diluir as fronteiras entre o Estado e a sociedade civil – e na reivindicação do monopólio da verdade.
O Estado brasileiro durante a Primeira República era apenas formalmente um Estado liberal-democrático, sendo de fato um Estado oligárquico, em que os resultados do sufrágio universal eram manipulados pela elite dominante que, dessa forma, se perpetuava no poder. Contudo, se no plano político a Primeira República não foi nem mesmo liberal e muito menos democrática, no que se refere às relações entre Estado e mercado no plano da regulação das relações econômicas e sociais o Estado brasileiro foi equivalente aos estados liberais. Percebe-se assim que, apesar das particularidades do processo de formação e de transformação do Estado brasileiro, o que ocorreu aqui não estava descolado do que se passava no restante do mundo ocidental. Afinal, o Brasil sempre manteve estreitas relações econômicas, políticas e culturais com a Europa e os Estados Unidos.
Welfare state keynesiano Estado providência  ou Estado assistencial, ou Estado de bem-estar social. No entanto, independentemente dos nomes dados, todas essas denominações fazem referência a uma forma específica de relação do Estado com o mercado que iria suceder o Estado Liberal e que usaria a força estatal, por meio da implementação de políticas públicas, visando intervir nas leis de mercado e assegurar para os seus cidadãos um patamar mínimo de igualdade social e um padrão mínimo de bem-estar. Mudanças como essas supõem profundas mudanças de cultura, que costumam ser bastante lentas, pois implicam na revisão de todo um sistema de crenças. Tal como o Estado liberal só pôde se implantar plenamente depois que a secular cultura de responsabilidade das classes ricas pelas mais pobres tivesse cedido lugar a uma outra, em que todos os indivíduos passassem a ser vistos como cidadãos iguais, independentes e responsáveis pelo seu próprio sustento e destino, o Estado de bem-estar social só se consolidou quando a cultura individualista, que havia se consolidado nas sociedades liberais e que via no Estado um mal necessário, cujas atribuições deveriam se restringir ao mínimo essencial para viabilizar a vida em coletividade, cedeu lugar a uma outra cultura mais solidária.
A grande diferença entre o Estado da Europa e demais países capitalistas desenvolvidos e o Estado de bem-estar social brasileiro, criado durante o governo Vargas, é que, no Brasil, além da regulação do mercado e da promoção do bem-estar por meio de políticas públicas de educação, saúde, previdência, habitação etc., o Estado também teve o papel de promotor da industrialização do país. Se nos países capitalistas centrais a era da industrialização coincidira com o Estado liberal e antecedera a era das políticas sociais, trazidas pelo Estado de bem-estar social, no Brasil as fases de industrialização e de criação de políticas sociais foram concomitantes e coincidentes com o Estado de bem-estar social. Por isso, essa nova forma de Estado foi aqui chamada, preferencialmente, de Estado desenvolvimentista. A Revolução de 1930 pôs fim ao Estado oligárquico e ao sistema de organização institucional sobre o qual ele se baseava. Coube então ao novo Estado construir, a um só tempo, as novas bases de desenvolvimento econômico e acumulação capitalista e de legitimação de uma nova ordem política no país, com a incorporação das massas no processo político.
Assim, a partir de 1930 o Estado brasileiro passou a intervir crescentemente e de forma decisiva no desenvolvimento econômico e social do país por meio de um conjunto de instrumentos, criados ao longo do tempo, com objetivos e ações próprios, mas relacionados e coordenados:  o Departamento Nacional do Trabalho, o Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalização e o Departamento Nacional de Produção Mineral, no interior do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, assim como o Instituto Nacional do Cacau da Bahia, o Departamento Nacional do Café e o Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool (IAA); os códigos de águas, de minas, de caça e pesca e de florestas; Ministério da Educação e Saúde Pública; sindicados de empregadores e de empregados; a modificação da lei de férias e criação da carteira de trabalho para os trabalhadores urbanos; a edição do código de menores, regulação da jornada de trabalho de oito horas diárias e a regulamentação do trabalho feminino; Aposentadoria e Pensão (IAP), o dos marítimos (IAPM), que deu o padrão para a criação dos demais institutos que substituíram as antigas CAPs, organizadas por empresa; Administração Pública federal conforme os padrões mais modernos vigentes nas sociedades capitalistas avançadas, instituindo concursos públicos, estruturando carreiras e profissionalizando o serviço público; Conselho Nacional do Petróleo e o Conselho de Imigração e Colonização (1938), a Comissão Executiva do Plano Siderúrgico Nacional (1940), a Comissão Nacional de Ferrovias, a Comissão Nacional de Combustíveis e Lubrificantes (1941) e a Comissão Vale do Rio Doce (1942).
 No entanto, a década de 1970 coincidiria com o fim do período de expansão das economias capitalistas em todo o mundo, após trinta longos anos de expansão continuada. Enquanto o mundo crescia sem parar e o nível de bem-estar das pessoas, em geral, aumentava, ninguém ousaria seriamente contestar o modelo econômico e o papel do Estado. Foi assim nos Estados Unidos, Europa, América Latina e Ásia. A favor das privatizações, alegava-se que as empresas de propriedade do Estado seriam ineficientes e deficitárias, porque mantidas sob a proteção do poder público ao abrigo das leis do mercado. A consequência dessa ineficiência resultaria em crescentes déficits a serem cobertos pelos contribuintes. Ao contrário do que pensavam os liberais do século XIX, esses mercados não seriam autorreguláveis, necessitando a regulação do Estado para que pudessem funcionar adequadamente. O problema, portanto, não teria sido a regulação estatal em si, mas o seu excesso, que acabou comprometendo o bom funcionamento dos mercados existentes ou mercados potenciais – isto é, naquelas esferas das atividades econômicas sob monopólio estatal, mas passíveis de serem privatizadas. Quanto às políticas sociais, estas manteriam seu lugar na agenda do Estado como direitos de cidadania e instrumentos de promoção da equidade. Algumas delas seriam compensatórias, temporárias e focadas nos mais pobres e atingidos pelo processo de ajuste da economia patrocinado pelo Estado – como as de transferência de renda para combate da pobreza absoluta e de seguro-desemprego –, mas outras deveriam ser universais e permanentes – como as de educação, saúde pública e formação profissional.
Mais do que a integração dos mercados de bens, serviços e capitais, a globalização iria ensejar, sobretudo, a desregulamentação e integração dos mercados bancários e financeiros das diferentes economias nacionais do mundo capitalista. Com isso, iria se criar um mercado financeiro internacional, altamente dinâmico e volátil, no qual capitais oriundos dos quatro cantos da Terra seriam aplicados nas bolsas de valores das diversas praças financeiras espalhadas pelo mundo, deslocando-se com velocidade jamais vista de um lado para o outro do planeta. Algumas estimativas apontavam que, em meados da década de 1990, a circulação desses capitais entre os diferentes mercados financeiros do mundo seria de cerca de um trilhão de dólares por dia, “valor superior à soma de todas as reservas de todos os Bancos Centrais do mundo” .
Além de ter permitido a formação de um mercado internacional de capitais, que aumentaria enormemente a vulnerabilidade das sociedades frente à movimentação internacional do capital, tornando Estados nacionais incapazes de controlá-lo e oferecer uma proteção mais efetiva às economias domésticas, as inovações tecnológicas iriam ensejar a criação de novos mercados, a mudança nos padrões dos serviços e a reorganização dos capitais em nível internacional. O caso das telecomunicações é emblemático. As mudanças tecnológicas nas comunicações, representadas pelo desenvolvimento de fibras óticas, da telefonia celular em diversas bandas, da transmissão por cabo etc. permitiram, em pouco tempo, que esse cenário fosse radicalmente modificado. Por meio  de uma pluralidade de tecnologias, com relativamente baixos custos de investimentos iniciais, o monopólio natural deixou de existir, permitindo que surgisse no seu lugar um novo mercado altamente rentável para os capitais privados.
BIBLIOGRAFIA:
Estado, governo e mercado / Ricardo Corrêa Coelho. – Florianópolis : Departamento de  Ciências da Administração / UFSC; [Brasília] : CAPES : UAB, 2009. 116p. : il.